Depois
do excelente, intenso e desconfortável (no bom sentido, é claro) Incêndios (Incendies, 2010), o diretor Denis Villeneuve nos brinda agora com o
thriller dramático Os Suspeitos (Prisoners, 2013). Esses são dois filmes
completamente diferentes, porém, ambos tocam o espectador de forma ampla e
direta, um sendo desconfortável, como já citei, enquanto o outro, entre muitas
coisas, incita o questionamento sobre até que ponto somos capazes de ir para
defender nossos entes queridos.
Partindo
do ponto em que vemos pai e filho caçando um veado, onde antes de abater o
animal o pai reza uma prece, no claro intuito de se desculpar por aquela ação,
seguimos para o que será de fato o ponto de partida para todos os
acontecimentos do longa: o almoço do Dia de Ação de Graças, onde as famílias
Dover e Birch, percebem que suas filhas pequenas desapareceram. É interessante notar
como desde o momento em que os Dover saem de casa em direção à casa dos amigos,
a aura de suspense que ronda a família nos diz que algo está para acontecer.
O
sumiço de Anna Dover e Joy Birch se dá logo após o almoço, quando Anna pede aos
pais para voltar em casa na companhia da amiguinha e procurar seu “apito
vermelho de emergência”, que havia perdido. Ao concordar que as meninas fossem
com seus irmãos mais velhos, as famílias passam a tarde descansadas, até que
percebem que elas saíram sozinhas. E que não voltaram. A partir daí o ritmo dos
acontecimentos se acelera e qualquer pista pode ser importante para
encontrá-las, como por exemplo, o trailer que havia estacionado perto da casa e
as garotas haviam se interessado mais cedo em um passeio com os irmãos.
Alex
Jones (Paul Dano), dono do trailer que é encontrado posteriormente pelo
Detetive Loki (Jake Gyllenhaal), à beira de uma floresta e em uma noite de
chuva torrencial, torna-se o principal suspeito ao tentar fugir do local quando
abordado. O rapaz é levado por Loki e interrogado, mas por não ter provas
contra ele acaba sendo solto, o que desperta a ira de Keller Dover (Hugh
Jackman), que resolve investigar Alex por conta própria.
“A
atuação de Hugh Jackman está soberba”. Ele nos entrega em Keller um personagem
forte, determinado, capaz de tudo por sua família. E quando eu digo tudo, é
tudo mesmo, inclusive ir contra os seus princípios e sequestrar e torturar o
principal suspeito de ter levado sua filha, mas não sem antes rezar e pedir
perdão por seus atos. Aliás, o filme como um todo é permeado por inserções
religiosas, mas sem exagero, movendo a ação de alguns dos personagens. Maria
Bello interpreta com afinco a esposa de Keller, Grace Dover. Sua personagem é quase
delicada, entra em surto facilmente e nos convence de sua quase loucura apenas
por seu olhar.
Os
pais de Joy, Franklin e Nancy Birch, são vividos por Terrence Howard e Viola
Davis, respectivamente. Franklin é mais sereno, se deixa levar pelos impulsos
de Keller e não deixa muito a acrescentar como personagem além de pai
desesperado pelo sumiço da filha. Mas com relação à Nancy, que atuação de Viola
Davis! Ela consegue perder o olhar e se deixar levar pela tristeza enquanto
observamos sua cozinha completamente bagunçada, com os pratos, copos e restos
do almoço de Ação de Graças que ocorrera dias antes, e no momento seguinte se
impor diante das decisões de Keller e do marido de forma enérgica. Ouso
acrescentar que, não fosse Melissa Leo e Jake Gyllenhaal, poderia ser dela a
melhor interpretação no filme. Já que citei Melissa Leo, sua personagem é Holly
Jones, tia de Alex, que entra em cena de forma reservada, mas que vai ganhando
espaço e nossa consideração ao longo do segundo e do terceiro atos, visto que
seu sobrinho Alex está em “evidência” por causa do sequestro. Fechando com
relação às atuações, temos um detetive ousado, marcante, vivido por Jake
Gyllenhaal. Loki possui, digamos, algumas manias, como o constante mexer das
sobrancelhas, o que concede ao personagem um ar inquietante.
Complementando
o clima de tensão que presenciamos ao longo do filme, temos fatores como a
frieza, e por que não dizer o ar de suspense, transmitidos pela excelente
fotografia de Roger Deakins, onde vemos muita neve, muita chuva e locais escuros, suspeitos,
em grande parte das vezes acompanhados por sombras. A música de Johann
Johannsson é precisa, marcante, retumbando em nossos ouvidos em momentos
pontuais, mas sabendo se manter distante dos momentos em que o silêncio se faz
necessário.
O roteiro de Aaron Guzikowski nos leva a acompanhar
cada ato, cada cena, com a máxima atenção, deixando algumas pistas durante o
filme – como Bob Taylor, que entra em cena para auxiliar em alguns pontos e nos
entregar, em minha opinião, uma das cenas mais tensas do longa –, mas em
momento algum explicitando o que deseja ao espectador: precisamos pensar por
nós mesmos, e em alguns momentos torcer para que determinado personagem aja rápido,
lembre de algo, pois estamos a sua frente e já percebemos algo extremamente
importante. Nada é por acaso. Não passamos apenas pelo filme, fazemos parte
dele no quesito interpretação, mas nada nos prepara para o grande momento do
terceiro ato, onde nos perguntamos em que instante deixamos passar essa ou
aquela informação, ou em que ponto nos perdemos e não percebemos o que estava
para acontecer.
Finalizando de forma espetacular, Os Suspeitos – acho que o título original, Prisoners, tem muito mais a ver com o contexto, mas ok! – é um
filme intrigante, inteligente, que começa aos poucos enredar o espectador e
quando vemos estamos imersos nele de tal forma que quando somos surpreendidos
pelo seu final, ficamos a ponderar ainda mais sobre cada ato de cada personagem
que acompanhamos durante os seus pouco menos de 150 minutos de duração. E é um
filme que quanto mais analisamos, mais interessante ele fica, mais nuances são reveladas,
mostrando que Denis Villeneuve sabe o que fazer para prender o espectador à
história, ou vai dizer que também não ficamos refletindo dias a fio sobre Incêndios, após tê-lo assistido?
Cotação: 5/5
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